sábado, 23 de junho de 2012

Cinema e Televisão:iguais mas só na superficie



Desde 2009 estou direcionando minha carreira para cinema e televisão e  tenho passado por alguns cursos e oficinas que preparam atores e atrizes para estes formatos.Revi algumas anotações realizadas em sala de aula. São lições teóricas e observações descobertas  durante os exercícios de atuação em monólogos, duplas, trios feitos  para a câmera. São descobertas ainda em processo de prática e
amadurecimento.

Sou uma atriz de teatro.  Ainda tenho muito que aprender a respeito destas duas linguagens que apresentam exigências para o ator e atriz ainda não acostumados com o vídeo. A única certeza que tenho até agora, depois de ter frequentado estes cursos e oficinas, é que não há fórmulas mágicas que ensinem a atuar em cinema e televisão. É uma questão de hábito, prática e compreensão de como trabalhar a energia da interpretação no video.
Não importa se é televisão ou cinema. 
O ator tem que estar disponível  fisicamente, sensorialmente para se comunicar nestes veículos.
Evitando  o excesso do teatro.



Uma observação pessoal quero colocar. E enfatizo que é minha opinião. O ator, a atriz tem de interpretar para o colega, o comparsa de cena. Não é para a câmera. Não tem que se preocupar com a câmera. Eu não interpreto para a câmera. Eu interpreto sim com a câmera. Eu estou em cena, em um contexto situacional, estou interagindo com o ambiente, com outros atores e situações. Não tenho que atuar para a câmera. Conhecendo e respeitando as caracteristicas de cada formato, tenho sim de representar para o meu colega de cena. A câmera é que tem de se preocupar com o ator.


Como estou falando neste mês sobre "atuação", gostaria de compartilhar com os colegas algumas dessas descobertas e aprendizados, que espero sejam ampliados pelos mesmos em seus trabalhos profissionais e em estudo individuais e coletivos. 
Elaborei estas observações  dentro de um quadro comparativo.  Pensando que assim seria mais interessante perceber as especificidades de cada formato. Sei que há muito mais a escrever sobre o tema e que este quadro está incompleto.
Vou  escrever mais sobre o assunto. Provavelmente ao longo de 2012. Quando vou frequentar mais dois cursos de cinema e um workshop de TV. 




Um livro interessante e muito bom sobre o tema é “Telenovela um olhar do cinema” de José Roberto Sadek, Summus Editorial, 2011.

Sobre a atuação do ator em cinema li, estudo e recomendo os seguintes capítulos :
"V, trecho O ator no cinema" que está no livro ESCULPIR O TEMPO de Andrei Tarkovski e o  "9, ´Radio-Cinema-Televisão" que se encontra no livro  O ATOR NO SÉCULO XX  de Odete Aslam.



QUADRO COMPARATIVO CINEMA X TV

no cinema o espaço é tridimensional
na televisão o espaço é bidimensional
prevalece na atuação do ator para cinema a improvisação, desenibição e naturalidade em cena
prevalece na atuação do ator para televisão o uso de linguagem naturalista e realista em cena
o ator necessita  compreender os limites geográficos da cena para atuar, como marcação frente a câmera, personagens, objetivos, obstáculos , conflitos de cena
o ator necessita  compreender os limites geográficos da cena para atuar, como marcação frente a câmera, personagens, objetivos, obstáculos , conflitos de cena
o ator deve trabalhar  e desenvolver  uma boa concentração devido ás repetições de cena
na TV o ator dispõe só de alguns minutos para estudar seu texto e suas marcas, mas não prepara sua interpretação, se dirigindo para o local onde deve se posicionar e espera o sinal do diretor
comunicação entre ator, diretor e equipe são importantes para a realização  do filme
na TV  a diversidade de planos é igual a do cinema, mas neste  formato prefere-se o uso de closes dos atores
técnicas e exercícios de construção de personagens são usados para ajudar o ator a encontrar o seu papel
é importante ensaiar antes de gravar a cena, para realizar correções  ou sugerir mudanças na interpretação dos atores
há o desenvolvimento de uma dramaturgia colaborativa com diretor e preparador de elenco
na televisão os personagens pertencem a  vários núcleos familiares e cada um destes núcleos tem uma função na trama da novela
dirigir e ser dirigido , há uma contribuição do ator ao projeto/processo de criação
existe uma relação distinta entre o movimento do ator no set e o deslocamento da câmera
no cinema, o diálogo entre os atores/atrizes/ personagens deve dizer o que  a câmera já está mostrando
há opção de entregar ou não o roteiro aos atores/atrizes
prevalece o naturalismo em cena, porque o ator  se esforça para mostrar um personagem de verdade, o ator atua de forma visual e comportamental com ou sem diálogos
como ocorre no cinema, na TV as experiências interiores  dos personagens podem ser expressas visualmente por meio de cenários, objetos e estados de espírito escolhidos pelo diretor
as personagens  de um filme devem ser mostradas em ações, pois suas ações devem mostrar as suas tensões internas
o  ator deve ter noções de plano X contraplano e ambientação no estúdio para saber direcionar melhor a sua energia e o foco no momento da atuação
no cinema  o ator não deve apenas desenvolver a idéia de um subtexto, mas a expressão física dele
o  personagem de TV está mais próximo do realismo cotidiano, o que exige do ator uma postura corporal mais  próxima do dia-a-dia.
disponibilidade física e sensorial do ator para atuar na ficção
o ator necessita realizar um aquecimento/exercício   anterior a cena para motivar o corpo para a ação
o ator apenas se preocupa em viver as circunstâncias sugeridas e propostas pelo filme
o ator deve ter abertura na atuação, abrir sua “alma” para sentir, ouvir, escutar a si e ao outro
usar a respiração como um exercício para estimular o corpo  a se sensibilizar e revelar emoções

Assistir :



LEITURA:



sábado, 9 de junho de 2012

Fazendo a lição de casa

Acredito que todo processo de preparação de um personagem, seja em que técnica ou método de atuação for, começa na leitura textual. Não importa se é uma peça de teatro, um roteiro de cinema ou TV, um texto improvisado ou apenas uma idéia criada a partir de uma imagem. O ator, a atriz tem de partir de um texto. Descobrir o personagem no universo fictício da escrita.
Qual é a proposta do texto? Do diretor? Que elementos humanos o texto apresenta ou sugere? E como criar fisica e psicológicamente o elo entre estes três aspectos artísticos, para materializar um ser em cena.
Desde 2003, quando decidi me profissionalizar e comecei a frequentar a escola de teatro, o livro de autoria de Stella Adler “Técnica da representação teatral” tem sido um companheiro constante e obrigatório onde quer que eu vá ou esteja. Graças aos ensinamentos e orientações valiosas da atriz e professora Stella Adler sobre a “arte da representação” acredito que estou aprendendo a "pensar com sensibilidade, a me conduzir e direcionar a energia necessária ao personagem sem excessos e exageros".

 O que me agrada e me seduz na leitura deste livro, é que não consigo vê-lo como um guia ou manual sobre interpretação. É porque esta grande atriz apaixonada pelo seu ofício e arte, não dá receitas. Não fornece fómulas mágicas sobre  atuação.  Não ensina um repertório de truques.  Ao contrário, como uma atriz experiente e estudiosa do “sistema de Stanislavski”, a professora Adler apenas compartilha em seu livro lições, orientações e conselhos preciosos sobre atuação. São ensinamentos que facilitam ao ator e a atriz perceber onde estão os problemas técnicos e humanos  na interpretação  e os compreendendo, conseguirem  atuar de maneira  orgânica com paixão e veracidade.
Adoro os exercícios físicos e sensoriais que sugere aos atores experimentar. São "exercícios orgânicos" que funcionam como canais para despertar reações espontâneas em circunstâncias exteriores e interiores. Ela fala da importância de se partir do texto, da leitura inicial que deve ser feita pelo ator, e como fazê-la para se construir um personagem com vida e credibilidade.

Ela ressalta e insiste que o personagem elaborado pelo ator, para ser consistente e ter profundidade humana, deve ter como referência para sua construção, "o estudo e a compreensão da mentalidade e do contexto social e época no qual o personagem está inserido".  Por meio deste seu livro “escrito e inspirado nos ensinamentos do mestre russo”, temas na trilogia de Stanislavski (a preparação do ator, a construção da personagem, a criação de um papel) que eu não tinha conseguido compreender anteriormente, hoje,  se tornaram claros e acessíveis para mim.


Ela mostra que "atuar exige não só preparo corporal e intelectual, mas muita disciplina, empenho, motivação, estudo, cultura e curiosidade" para que o artista alcance “maturidade” em seu trabalho. Só assim desenvolverá sua arte.

EM “TRANSE”.

Na escola de teatro, como na época do teatro amador e semiprofissional, tive contato com a maioria dos sistemas ou métodos de atuação” consagrados no mundo inteiro. Conheço os principais métodos de interpretação para treinamento do ator como o de decroux, dullin, meyerhold, delsarte, barba, piscator, craig, appia. No curso teatral, experimentei em muitos exercícios, as principais técnicas de atuação como a de artaud, brecht, grotowski, stanislavski, wilson, brook, michael tchekhov, meisner. 
Mas se me perguntarem qual é a melhor e mais eficaz técnica para preparar um ator para a cena, eu não saberia responder. Todas ajudam de alguma maneira o ator a alcançar uma verdade cênica na atuação, mas confesso que não utilizo nenhuma destas técnicas teatrais no meu trabalho.  Posso apenas afirmar que tenho “conceitos e princípios sobre atuação” nos quais acredito. Porque os adquiri por estudo, experiência e prática teatral, para me estimular e motivar para a criação de um personagem. Sou uma atriz muito intuitiva. Gosto de "improvisar" e trabalhar muito com imagens e sugestões do que leio e observo na vida real para estimular e trabalhar a imaginação para começar a criar.

Um Estado de transe
Eu vejo e sinto o trabalho do ator como um “estado em transe”. Quando o ator está atuando, depois de se preparar e estudar seu papel, ele fica de tal maneira absorvido pela personalidade e motivações de seu personagem, que toda sua energia psíquica e emocional é intensificada e direcionada para o momento da interpretação, de tal modo que parece esquecer-se dele mesmo.
Neste “estado de transe entre ator e personagem”, não há tensão, resistências físicas ou bloqueios por parte do ator para mostrar o mais íntimo de seu ser, do seu personagem. O ator se entrega instintivamente, espontaneamente, visceralmente ao momento. O ator se despoja, se desnuda totalmente para que o outro ser que o habita na atuação, possa aparecer. Eu acredito que para o ator transmitir a vida interior de seu personagem, ele precisa primeiro preparar seu corpo fisicamente, sensorialmente, para que ele se sensibilize com essa vida interior que vai representar. Então é preciso ter uma técnica que o ajude neste preparo físico e emocional.

 
 
 
E é muito importante também, se conhecer como pessoa, como o ser humano que é, porque o personagem que o ator vai interpretar apresenta muitas vezes caracteristicas humanas (físicas, temperamento, convicções, interesses, afeições) que são diferentes das suas. O ator precisa romper barreiras de comportamento, valores e princípios morais e éticos que já estão enraizados em sua personalidade e maneira de enfrentar o mundo, para que possa se transformar no outro.
Mas para não ser um clichê, um personagem desinteressante, o ator necessita e muito trazer sua experiência de vida e seu mundo para o personagem. Porque é só com este “material humano” que o ator pode contar para revelar outro ser humano.  Com sua força, fraquezas, medos, dores, alegrias, valores, crenças, temperamento. É na sua experiência de vida que o ator vai buscar os elementos para criar e materializar espiritualmente este ser que até então só existia na escrita.
 
 
 
 
 
 
 
O ator precisa olhar para dentro de sí mesmo, e ver o que pode neste “momento de transe”, trazer à tona, resgatar para o personagem e o fazer vibrar e viver. Que traços de sua personalidade ou pessoa, ou de sua experiência de vida são e podem ser úteis ao personagem.

É assim que eu vejo e sinto o trabalho do ator. Como um "momento em transe"  no qual o ator compreende e alcança a dimensão humana de sua personagem e ela passa a existir em seu corpo.
UM PROCESSO

Desde julho de 2009, quando me iniciei nos “cursos de atuação para cinema e televisão” , tenho percebido que há uma grande diferença entre atuar no palco e em frente a uma câmera. Compreendi que a principal diferença está no “espaço físico” onde o ator atua e se movimenta, e em como a sua energia corporal, emocional e psicológica é estimulada, distribuída e direcionada  dentro deste espaço/campo de atuação, quando ele se relaciona e entra em comunhão  com os demais elementos que estão presentes na cena.
Quando “os monólogos de meu videobook” foram realizados, eu já tinha me iniciado na técnica de interpretação para a câmera. E esclareço que não foi nada fácil a abordagem da personagem dentro da linguagem de cinema e  televisão. Porque se no espaço teatral o ator explora mais a oratória e o exagero corporal para se expressar e se comunicar com o público, no espaço cinematográfico ou um set de televisão, sua gesticulação e movimentação obedecem a uma maior contenção e controle corporal. O que importa é a delicadeza, a sutileza de sua gestualidade e emoções


Minha abordagem é na base da intuição, imaginação e estímulo. Gosto de partir de “elementos humanos” que me são sugeridos pelo texto, fotos, imagens. O que é discutido e orientado pelo diretor, o que pode ser descoberto nos ensaios ou mesmo no momento da atuação com o parceiro de cena.
Também gosto de pesquisar, realizar leituras sobre o tema/assunto, e se possível realizar um laboratório teatral. Buscar a experiência concreta na vida real para compreender a situação dramática e o papel. Depois eu avalio e seleciono do material pesquisado e experimentado o que é essencial e pertinente utilizar no personagem que me cabe interpretar.Portanto, eu acredito em “um processo” exigente por parte do ator para sua preparação. 
No “monólogo da ex-viciada” realizei uma pesquisa sobre o tema das drogas e sobre o universo dos dependentes químicos. Li matérias sobre o assunto. Vi fotos para criar uma aparência condizente com a situação. Procurei entender o que as drogas causam no organismo de uma pessoa. Assisti depoimentos de pessoas que eram viciadas e que estavam em tratamento para se libertarem do vício.

Assisti alguns filmes (eu cristiane f drogada e prostítuida, drugstore cowboy, trainspotting, traffic, réquien para um sonho, diário de um adolescente,  e coisas que perdemos pelo caminho) para entender o que leva uma pessoa para este mundo e a faz acabar com sua vida. E descobri muitas outras coisas interessantes que me inspiraram depois na hora de criar e atuar. Uma imagem que muito me impressionou está em uma cena do filme "eu cristiane f drogada e prostítuida".
 
Meus professores de interpretação sempre me alertaram para o aspecto emocional da atuação. Sempre me lembraram que o ator nunca deve forçar a emoção. Um sentimento.  Porque se ele compreender o que está acontecendo ao seu personagem, entender a cena, e as motivações de seu papel, será bem sucedido na interpretação e terá conseguido revelar sua personagem. São estes os conhecimentos que possuo sobre atuação.  Espero de alguma maneira ter acrescentado algo significativo sobre o tema.